A Argentina pode enfrentar nova rodada de pressão sobre o câmbio no segundo semestre deste ano, período que costuma ser marcado por saídas de dólares e maior busca por proteção em moeda forte antes das eleições legislativas de outubro. A avaliação é do Bradesco BBI, que vê espaço para uma depreciação moderada do peso argentino (ARS), mas longe dos episódios de estresse registrados em pleitos anteriores.
Em relatório enviado a clientes, os analistas do banco dizem que a dinâmica cambial da Argentina tem passado por mudanças, puxadas principalmente pelo avanço das exportações de petróleo e gás natural. O país, historicamente dependente das exportações agrícolas no primeiro semestre e afetado por forte saída de dólares no segundo, começa a reduzir essa dependência graças ao crescimento da produção na região de Vaca Muerta.
De acordo com o levantamento, a entrada média mensal de dólares saltou de US$ 19 milhões, no período entre 2013 e 2018, para US$ 304 milhões entre 2019 e este ano. O problema é que outubro continua no centro das atenções. É justamente no mês da eleição legislativa, marcada para o dia 26, que tradicionalmente ocorre o maior desequilíbrio entre oferta e demanda de dólares no país.
Os analistas lembram que movimentos semelhantes ocorreram em março e abril deste ano, quando o governo de Javier Milei ainda não havia fechado acordo com o Fundo Monetário Internacional (FMI), os controles de capitais (Cepo) permaneciam ativos e os preços do petróleo estavam sob pressão, em meio à escalada da guerra tarifária liderada pelo presidente dos Estados Unidos, Donald Trump.
Para reduzir a pressão sobre o câmbio, o governo argentino aposta em um novo programa de anistia fiscal, o blanqueo, lançado em setembro do ano passado. A estratégia mira a regularização de ativos mantidos fora do sistema financeiro. Segundo dados do Banco Central da Argentina (BCRA), os argentinos mantêm cerca de US$ 255 bilhões não declarados no exterior. A expectativa é que parte desse dinheiro entre no circuito formal da economia, ajudando a reforçar as reservas internacionais nos meses que antecedem a eleição.
Simulação e potencial
O Bradesco BBI fez uma simulação: se 2% das famílias argentinas, o que representa aproximadamente 228 mil, repatriarem o equivalente a US$ 22,4 mil por família, volume que equivale ao preço médio de um carro novo, isso representaria uma injeção de US$ 5,1 bilhões na economia em até seis meses.
Apesar da possível entrada de recursos, o banco diz que o programa enfrenta resistência, principalmente pela falta de garantias legais. Não há uma lei que assegure que quem aderir ao blanqueo ficará livre de questionamentos futuros. O governo encaminhou um projeto ao Congresso, que até agora não avançou.
O levantamento também chama atenção para o comportamento do Investimento Estrangeiro Direto (IED), que segue abaixo do potencial argentino. Mesmo após o fim parcial dos controles de capitais, o país mantém um histórico que gera desconfiança. A percepção de risco segue elevada, em razão da série de calotes ao longo das últimas décadas, da insegurança jurídica e da dificuldade de proteger os investimentos da volatilidade do câmbio.
Dados compilados pelo Bradesco BBI mostram que, em 2023, os fluxos de IED na Argentina foram equivalentes a 3,7% do Produto Interno Bruto (PIB), patamar acima da média histórica de 1,9%, mas ainda inferior a mercados comparáveis na América Latina, como Chile (5,8% do PIB) e Colômbia (3,5%). Brasil (3,2%) e México (2,4%) também aparecem acima da média argentina.
Grande parte desses recursos, porém, não representa expansão produtiva, mas operações de endividamento entre subsidiárias locais e suas matrizes no exterior, segundo o BBI. Essas dívidas foram quitadas no início de 2024, o que gerou saída líquida de dólares. Os setores mais afetados foram comércio, mineração e indústria de transformação.
A percepção de risco político chegou a recuar com a condenação da ex-presidente Cristina Fernández de Kirchner, mas não o suficiente para destravar investimentos de longo prazo. Enquanto não houver uma política cambial mais previsível e garantias jurídicas, o interesse estrangeiro tende a se concentrar apenas em operações de curto prazo, com retorno elevado. Um exemplo citado no relatório são os títulos Bontes, que pagam entre 28% e 29,5% ao ano em pesos argentinos.
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